Azai Ichiko

 Azai Ichiko "Shinoyuki"

Por Mari Azai



O que sei sobre minha mãe.


Ela se chama Azai Ichiko, é uns 10cm menor que eu, mas tem um corpo fortão para uma senhorinha franzina. Acho que ela deve ter uns 35-40 anos. Tem cabelos castanhos, como os meus, mas é bem mais branquinha que eu. Tem umas cicatrizes medonhas pelo corpo e parece ser artista marcial 100% do tempo, embora diga que é também contadora – só não diz de onde, por isso que acho que é mentira.

Ela também não pode viver como sensei da dojo dela, só tem eu de aluna, o lugar era caindo aos pedaços e ela nem ensina bem!

Puta lutadora de karatê, num estilo que ela chama de “Hitotsu no Shinjitsu”, eu nunca havia ouvido falar desse estilo e ninguém com quem falei também. Esse estilo não tem graduações, não tem uniformes, e os golpes nem nome têm! Quando minha mãe me ensinou um uppercut que pode tirar do chão alguém já desequilibrado, perguntei qual era o nome do golpe e ela me perguntou: “Como você chama ele?” Eu disse “Chamo de Socão Arranca-do-chão”
E ela disse: “Então é Socão Arranca-do-chão”.

Como eu falei o dojo era numa parte bizarra de uma área comercial ruim de Nagoya. Tava caindo aos pedaços e era num prédio de dois andares, o dojo ficava no segundo, em cima de uma sex-shop maior palha. Era pequeno e não lembrava em nada um dojo, parecia, sei lá, uma academia de musculação dessas baratas, mas sem equipamento nenhum, só um piso stretch barato e parede descascada e cano no teto exposto. No final do ano passado (1988) pegou fogo e minha mãe sumiu.

Ela falava numa “guerra secreta” e em “guerreiros urbanos” e “Mão esquerda” e passava a impressão que ela fazia parte disso tudo.

O treino era dureza, saia sempre toda machucada e pensando seriamente em desistir, acho que quebrei a maioria dos ossos que quebrei na minha vida treinando com ela. Mas sempre ela me tratava no final com uma massagem milagrosa que botava até osso no lugar, e mandava eu voltar no dia seguinte. Eu fui na pira dela e voltava.

Nos últimos dias que eu vi ela, os treinos ficaram mais intensos, às vezes não era nem no dojo, ela parecia mais paranóica e insistindo que, por mais que eu me sentisse foda eu "era patética", "risível" e que "precisa melhorar muito se quisesse viver".

Nesses momento eu ficava com ela porque ela ainda deixava na cara que me curtia muito, mesmo só me xingando, e porque, sei lá, eu me sentia mais forte e me sentia bem com isso.

Daí um belo dia, eu chego lá e os bombeiros estão apagando o fogo do prédio, que tombou todinho, sobrou nada. Os bombeiros duvidam muito que alguém tenha sobrevivido a aquilo. Explosão fudida de gás, disseram.

Daí então nunca mais vi minha mãe.

Fiquei treinando só no dojo Oichi, bem rápido notei que meus amigos não tavam no mesmo nível que eu, daí amoleci. Me sentia bem, então foda-se se eu não ia mais ser uma máquina perfeita de chutar bundas, tava com meus amigos, meu namorado, então tava feliz.

Daí veio o bilhete que tava na cara que era da minha mãe, escrito com letras recortadas e coladas de revistas: "Viaje até Kobe, encontre uma boneca na Casa Assombrada". Só isso. E isso me levou até onde tô agora.

*****

Shiro veio com a informação que existe mesmo uma guerra secreta entre famílias de samurais e ninjas no Japão, e disse que a família Azai é uma dessas famílias de samurai, mas que ela tá metida em algum tipo de encrenca – parece que andou brigando ou matando gente na família Azai. Preciso saber disso!

Quanto a INTERPOL, parece não saber nada sobre minha mãe ou sobre essas Guerras Urbanas Secretas aí, espero que com a cooperação dos ninjas do Shiro a gente saiba mais. Mas primeiro a Charlotte.

Shiro me disse no trem  que as Guerras Secretas são combates, na maioria duelos formais promovidos pelo imperador para resolver disputas ente as famílias samurai, impedindo assim guerras abertas. Isso não impede que aconteçam duelos ilegais, mas isso é raro.  

As Guerras Secretas são um mecanismo de controle imperial que existe desde 1870, com o fim da Guerra Boshin, foi assinado um acordo entre os clãs de samurais e o imperador em manter os clãs samurais em segredo, desde que estes não resolvessem mais disputas com guerras ou armas de fogo ou qualquer outro tipo de arma ativada de outra forma que não esforço do corpo humano. O acordo trouxe à vida a “Sociedade da Mão Esquerda”, que é basicamente este submundo de samurais.

O que ocorreu recentemente com os Azai foi algo sem precedentes desde a desestabilidade provocada pela Segunda Guerra Mundial, a delegação Azai reunida em Tóquio foi exterminada. Azai Ichiko não deveria estar lá, mas foi vista no precinto por um sobrevivente cuja identidade está protegida pelos Yagyu. A sede do clã Azai é em Nagoya. Não foi o único caso, a família samurai Kono de Tóquio foi exterminada, com apenas um sobrevivente em estado grave. A delegação Azai e os Kono iriam fazer a segurança da cerimônia de contratos do novo Imperador.  

Cada clã samurai existe por aí espalhado pelo Japão, são doze, fora o Imperial:

1-Os Shimazu, cuja sede é em Kagoshima na província de Satsuma – a gente acabou de sair de lá! O líder é Shimazu Tadahide, o dono da Shimazu Corporation, aquela da régua!

2- Os Oda, que ficam na cidade de Tendo, província Imigata. A senhora dos Oda é Oda Noriko, uma campeã de patinação artística e mãe de um filho.

3- Os Date, na província de Myagi, cidade Sendai. O chefão é Date Yasumune um senhor velhinho ex-governador aposentado.

4- Os Tokugawa podem ser encontrados em Tóquio. O líder deles é Tokugawa Tsunenari é o dono da NYK! Ricão.

As outras Shiro só sabe os nomes.

5- Os Azai, Shiro sabe que eles são de Nagoya, mas o líder é secreto.

6 – Os Takeda. Shiro não sabe nada sobre eles. Eu descobri umas coisas! Eles nem usam o nome Takeda mais, a líder é Nanbu Toshiie, mas não sei de mais nada além disso.

7 – Os Uesugi. Shiro não sabe nada sobre eles. Depois que eles deixaram de ser samurais, ficou difícil, mas fiquei sabendo que vivem na vida acadêmica agora.

8 - Os Ouchi. De novo, Shiro não sabe nadinha. Eles acabaram lá para os tempos feudais, e não achei também nadinha.

9 – Os Mori. Mesmo, nadinha.

10 - Os Yamagawa. Shiro sabe nadinha.

11 – Os Asakura Shiro sabe de nada

12 - Os Hojo – Shiro não sabe de nada sobre ele, só um negócio de ser dois clãs em um que vivem brigando entre sí.

Os outros clãs.

Aí ele disse que tem outros clãs de samurai que são tão pequenos que são vassalos de outros maiores ou não participam ou sequer conhecem as guerras secretas. Mas 3 deles chamam atenção:
1 – Os Yagyu, os principais defensores do imperador.

2 – os Hatorii: Os espiões que juraram proteger o japão do próprio imperador, se necessário.

3 – Os Yamato – a família imperial.

O Shiro não sabe como achar eles direito, e nem se as coisas deles já apareceram em noticiário.

Eu lembro do Shiro dizer que os Azai não gostavam da minha mãe, agora porque? Shiro não sabe.

O que o Shiro sabe:

"Porque estão acusando minha mãe mesmo?"

Foi descrita como uma das atacantes por um sobrevivente. Shiro sabe que a testemunha não tem certeza disso e não sabe maiores detalhes. Mas sabe que os Azai nunca gostaram dela.

"O que ela fazia nessas guerras secretas?"

Shiro não sabe dizer, mas ela era uma assassina infame de apelido Shinoyuki.

 "Qual o estilo de luta dela?"

Shiro não faz ideia, mas me observando ele acha que é Jet Kune Do, ou algum tipo de Kung Fu.

"Ela já foi para o Brasil?"

Shiro não sabe disso.

*****

16/06/1989

Finalmente decidi escrever sobre minha conversa Azai Minomasa. Eu olhei nos olhos dele e perguntei se foi mesmo minha mãe que ele viu cometendo aquelas barbaridades e ele disse que sim... e ele não tava mentindo. Tá, quando eu insisti ele deixou passar que não estava certo de tudo que aconteceu naquele dia, o cara sofreu concussão e ficou um mês em coma, a cabeça dele pode ter misturados as coisas. Mesmo assim, tem aí a chance bem grande de que minha mãe seja uma assassina filha da puta trabalhando para os bandidos – Os Arashikage, ou o Exército da Vingança, ou sei lá – mas isso pode ser a verdade mesmo sobre ela. Minha mãe, o motivo inicial de eu estar nessa operação, pode ser um inimigo.

Isso me faz pensar, não, ter a convicção de que eu não tô mais nessa por conta dela, eu tô nessa pelos meus amigos, pra ver filho da puta se fuder, e pela própria porra da humanidade.

E também me faz pensar numa coisa – se ela é mesmo uma filha da puta, porque ela faria eu entrar para a Força Tarefa? Ou será que não foi nem ela que mandou aquele bilhete? Se não foi ela quem foi.

O negócio é, não sei mais se quero encontrar ela. É melhor eu nem saber o que ela realmente é, foda-se. Se eu descobrir mais é porque ela tá no meu caminho, e se ela tiver do lado errado, vou passar o trator em cima dela.

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